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Porque os brasileiros têm tanto medo de viajar?

Porque os brasileiros têm tanto medo de viajar?

Sempre me espantei de perceber como os brasileiros, em geral, têm muito medo de viajar, e hoje recebi um e-mail de uma leitora muito querida que confirma isso - pedi, e ela autorizou que eu transcrevesse o tal e-mail, que segue:
Olá Claudia,
Acompanho seu blog a pouco mais de 1 ano e AMOOO!!! 
Já vi várias vezes você escrevendo sobre a questão prioridade financeira para conseguir viajar tanto... Eu até sou boa nisso, consigo deixar a roupa nova ou a troca de carro por uma boa viagem.
A questão que me impede mais é o tempo e um pouco de medo de alguns locais... Sou administradora e tenho uma pequena delicatessen, arranjar uma semana fora é tão dificil... Como você se programa? Consegue fazer quantas viagens em média por ano?
Outra duvida é com relação a países menos turísticos, como Laos, achei lindo o videoclipe, mas como você conseguiu chegar lá sem uma excursão? Tenho 23 anos, comecei a viajar aos 16 sozinha, mas para a Europa que é moleza, só falar inglês. Meu receio é justamente os locais sem estrutura e que pouco se fala inglês, como chegar lá sem saber nada?!
É isso... 
Obrigada por compartilhar suas aventuras.
Embora o que tenha me chamado a atenção na correspondência seja a questão do confessado MEDO, também preciso antes esclarecer a leitora sobre o TEMPO.

Algumas pessoas já têm inclusive comentado isso aqui no blog, no sentido de que somente "felizardos funcionários públicos têm tempo para viajar assim".

Ora, é verdade que funcionários públicos, de um modo geral, assim como qualquer pessoa que seja empregada, tem um mês de férias, o que não é verdade para quem é autônomo, e está na iniciativa privada.

Primeiro, preciso dizer que, quando falo em priorizar as viagens, estou falando sério: eu comecei a priorizar quando escolhi a minha profissão que, além de me pagar razoavelmente bem, ainda me garante bastante tempo de férias - e isso porque, quando não estou de férias, estou constantemente de plantão - sábados, domingos e feriados, 24hs/dia.

Eu nunca escolheria ser médica, por exemplo, porque os médicos particulares param de trabalhar e param de receber, não podendo se dar ao luxo de ficar tanto tempo de férias - claro, claro, sempre existem exceções, só estou tentando explicar meu ponto de vista...a não ser, é claro, que fosse para trabalhar nos médicos sem fronteiras, o que deve ser maravilhoso!!

Então, quando falo que priorizar é coisa séria, é a isso que eu me refiro - já comecei a priorizar as viagens no momento de escolher a profissão!

Mas, de qualquer modo, posso garantir que é tudo uma questão de organização - conheço MUITAS pessoas, meus PAIS, por exemplo, que são comerciantes e conseguem, tranquilamente, se organizar para fazer todas as viagens que querem, ainda mais nestes tempos em que é tão fácil trabalhar e se comunicar pela internet...

Vencida a questão do TEMPO, vem o tema do MEDO: a leitora, como a maioria das pessoas que eu conheço, não tem medo de viajar para a Europa, que é moleza, só falar inglês, mas tem medo de países menos turísticos, como Laos (...), locais sem estrutura e que pouco se fala inglês...

O que eu posso garantir é que todos esses medos são fruto da nossa imaginação, dos nossos pré-conceitos

Quem disse que na Europa é moleza? 

Bah, já passei cada perrengue em Praga, tentando comprar uma simples passagem de trem, ou na Inglaterra, com 20 e poucos anos, mochileira, vinda da Holanda, sendo revistada de cabo a rabo pela polícia britânica em busca de drogas...e, como se sabe, nem sempre, na Europa, é "só falar inglês" - experimenta falar inglês numa cidadezinha no sul da Itália ou na Rússia!

Com certeza, a leitora também já passou trabalho na Europa, mas se sentia segura, porque, afinal, estava na Europa, primeiro mundo, lugares turísticos...

Por outro lado, quem falou que no Laos tem pouco turismo, falta estrutura e não se fala inglês??? Posso afirmar que todas essas impressões decorrem de fantasias equivocadas que a gente nutre sobre a Ásia, ou sobre a África, ou até sobre a própria América do Sul!!!

Saiba que no Laos, assim como no Vietnam e, mais ainda, na Tailândia, existe MUITO turismo - muito mais do que a gente pode imaginar. Aliás, o nosso nordeste deveria se envergonhar diante da grana que os tailandeses investem em turismo (e, principalmente, do que eles arrecadam com o turismo!)...

Quando a leitora fala de um país pouco "turístico", em que há pouca estrutura e não se fala inglês, me parece que está descrevendo...o Brasil!!!

Se há um lugar em que os turistas podem ter medo, é justamente aqui. No Brasil, a taxa de homicídios é de 27 a cada 100 mil habitantes (considerada como endemia pela OMS!). Morrem assassinadas, no Brasil, a cada ano, mais pessoas do que morriam na guerra do Vietnam. Vivemos uma guerra civil em nosso próprio país - então porque o medo de viajar???

Uma coisa que eu aprendi viajando pela Ásia é justamente que pobreza (ou miséria) não se confunde com violência. Em Mumbai, na Índia, por exemplo, um dos lugares mais miseráveis do mundo, não há violência. A gente caminha pelas ruas na maior tranquilidade, com a certeza de que nada de mal nos acontecerá. Até porque, se nos fizerem qualquer mal, o karma deles estará prejudicado para toda a eternidade!!

na Tailândia, leite em caixinhas: uma comodidade para as mamães viajantes difícil de se encontrar em países "de primeiro mundo"

em Bangkok, no saguão do nosso hotel - ATMs espalhados por todo lugar, já no Brasil...

em lugares movimentados, a preocupação com a segurança

shopping center só de produtos eletrônicos - Miami é fichinha!

Mas, muito mais do que o fato de que nós, viajantes brasileiros, não devemos ter medo de viajar para qualquer destes lugares em função de violência, o que eu realmente queria frisar nesta resposta à nossa leitora é que as pessoas precisam saber que nestes países supostamente "pouco turísticos" se fala muito inglês e há muita estrutura para os turistas, por mais inacreditável que isso possa parecer aos ouvidos ocidentais.

de motoca alugada no Laos

numa excursão, você não tem tempo para estes sorrisos...

No Vietnam, a título de exemplo, você chega em Hanoi e, no minuto seguinte, está instalado em um dos ótimos albergues existentes na parte mais fantástica da cidade, todo mundo falando inglês contigo, passeios agendados pelo próprio albergue (ou numa das inúmeras agências ali pertinho) para os próximos 3 dias, idênticos àqueles que você faria em Maceió: a van passa para te pegar às 8 da manhã, leva para conhecer os lugares interessantes, guia explicando tudo em inglês, almoço incluído, gringos felizes da silva, todos entregues nas portas dos seus respectivos hotéis às 6 da tarde. 

Nesse esquema, por exemplo, nós fomos a Ha Long Bay, uma das maravilhas deste mundo. 

Como se estivéssemos indo a Porto de Galinhas. No stress total. E o barco era muito mais confortável do que aquelas jangadas nordestinas, ressalte-se...

os luxuosos barcos de passeios vietnamitas

e a comida luxuosa de Hoi An, no interiorzão do Vietnam

Em Luang Prabang, no Laos, você pode alugar uma motoca, pedir um táxi para o aeroporto ou marcar um passeio com elefantes no conforto do seu hotel. 

Eles fazem de tudo para te ajudar - e as "comissões" que te cobram por estes serviços (como café da manhã levado no quarto do hotel) são infinitamente inferiores às que te cobrariam em Berlim. 

Eu sei que as pessoas têm dificuldade de compreender isso, mas, em Vientiane, a capital, existem hotéis excelentes por preços maravilhosos. Restaurantes franceses com preços muito melhores que os dos botecos do Rio de Janeiro. 

No sky train de Bangkok, parece que você está na Suécia (você só percebe a diferença quando sai do trem e sente o bafão dos 40 graus tailandeses na sua cara) - coisa de primeiríssimo mundo em plena Tailândia, com a vantagem dos preços asiáticos, sempre bem mais camaradas.

o fantástico skytrain tailandês: sonho de consumo de todo brasileiro

Não sei se estou me fazendo compreender, mas o negócio, em suma, é o seguinte: na Ásia, qualquer pessoa que se relacione minimamente com turistas falará inglês. 

Os taxistas, motoristas de riquixá, recepcionistas de albergues, garçons de restaurantes, e mesmo as pessoas nas ruas a quem você pedir informação certamente farão um esforço bem maior para se comunicar com você do que um parisiense! 

De que adianta falar um ótimo inglês, se um new yorker dificilmente se dignaria a interromper o seu caminho para te ajudar a encontrar o teu?

o inglês é a língua universal


Uma última coisa: é claro que tu não vais "chegar lá sem saber nada", mas também não precisas de uma excursão (deusmelivre!) para chegar lá!

Primeiro, tem que fazer a lição de casa, vir aqui no blog, perguntar, pesquisar na internet e, principalmente, comprar um ótimo guia sobre o lugar que tu pretendes visitar - eu recomendo sempre os da Lonely Planet, que eu a-do-ro!

Depois, vais comprar os vôos e seguros de saúde pela internet, reservar alguns dos hotéis pelo Booking.com ou pelo Hostelworld.com...enfim - para que precisas mesmo de uma excursão??

Só se for para alguma guia chatérrima e sem nenhuma noção ficar te apressando para voltar ao ônibus bem na hora que os monges te convidaram para almoçar com eles no monastério de Mandalay!

numa excursão, nós nunca teríamos encontrado estas pessoas

mas, mesmo sem excursão, o "táxi" pode ir te buscar no hotel para te levar ao aeroporto!

Querida leitora: vai por nós - temos certeza que será tão fácil para ti encontrar um passeio ao Parque Nacional Gorkhi Terelj, no meio da Mongólia, quanto seria encontrar em Paris um passeio ao Vale do Loire! 

a "estrutura" dos gers mongolianos pode ser melhor que a de muitos albergues espanhóis - é tudo uma questão de perspectiva!

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Claudia Rodrigues Pegoraro

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13 comentários:

  1. Verdade verdadeira. Também não entendo porque todo mundo arregala os olhos quando falo que vou pra Ásia. É tudo tão prático para o turista. E nosso $$$ rende que é uma beleza.

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    1. Ainda bem que tem gente esperta por aí, né Amanda? Como nós!!!! Heehehehehehe
      Bjokas, CLaudia

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  2. Claudia,amei seu blog e mais ainda a sua tranquilidade e facilidade de realizar todas estas viagens,que confesso ser o meu maior sonho,mas tb esbarro muitas vezes na questão "medo" de enfrentar o desconhecido e não ter como se virar na lingua,mas pelo jeito não é tão complicado assim.
    Pretendo ir pra Asia,obvio que tb detesto excursão,será que vc poderia me passar suas dicas desta viagem?
    Aí vai meu email: suzinara@hotmail.com.br
    Tb não sou tão descolada assim na internet
    Bjs
    Suzinara

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    1. Oi Suzinara,
      Melhor tu me dizer o que precisas saber! Nossa última viagem durou 5 meses pela Ásia, as dicas são o blog inteiro kkkkk
      Pode ficar à vontade para perguntar tudo o que precisares saber!
      Bjokas

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  3. Amei esse post. É claro que adoramos quando encontramos pessoas que pensam como a gente mas você foi extremamente clara e racional. Adorei a frase "pobreza (ou miséria) não se confunde com violência". Foi o que descobrimos na nossa viagem pela Ásia. Infelizmente o lugar mais caro, inseguro e difícil para ser mochileiro é o Brasil. Estamos olhando seu blog porque desistimos daqui e queremos percorrer a América. Está sendo muito útil. Continuem as boas viagens e sejam iluminados.
    Vânia e Carlos

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  4. Que legal Vânia e Carlos! :-)
    Por onde vcs querem começar a desbravar a América???

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  5. Muito bacana o seu texto, Cláudia! É engraçado como as pessoas têm esses medos infundados. Já me perguntaram, antes de uma viagem ao Oriente Médio ou ao México, por exemplo, se esses lugares não seriam perigosos. Minha resposta padrão é: "Perigoso é o Brasil e não é por isso que nós deixamos de viajar por aqui". E falo também que fui assaltado viajando em apenas um país (adivinha qual?).

    E tem ainda aquela crença nacionalista de que o Brasil é um paraíso turístico (eu sempre me pergunto como é que um sujeito brancão, louro, com 2m de altura, sem falar português, consegue passar incólume uma semana no Rio ou em Salvador). Eu sinto até vergonha quando vejo comparações de estatísticas relacionadas ao turismo no Brasil e em outros países "perigosos e sem infraestrutura".

    Agora nós temos um filhinho de 1 ano e 5 meses, aí então é que a turma do medo acha que nós somos doidos: "como vocês podem levar um bebezinho para um lugar desses?" Aos 8 meses, ele foi conosco para o Atacama e, com pouco mais de 1 ano, viajamos por quase 40 dias com ele pela China e pelo Japão.

    Parabéns pelo blog, que é uma grande inspiração para nós!

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  6. Sensacional seu blog. Viajo com minha filha desde que ela tinha 1 ano de idade. Agora tem 6 , e daqui poucos dias iremos fazer um mochilão no Leste Europeu, mas ontem comecei a pensar no próximo destino e pensei em Thailandia, Vietinã, Cambodja e logo em seguida senti um certo receio, um" friozinho na barriga" e pensei: Será que tenho coragem? Com suas dicas o empurrão foi dado. Vou para todos os cantos do mundo, e concordo com o fato de ser muito mais difícil e caro viajar pelo Brasil. infelizmente Brasil fica pra uma outra viagem.Entre esses três destinos citados, vc começaria por onde? Obrigada

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    1. Começaria pela Tailândia, Paula, que é um hub de voos baratos na Ásia. De lá vc cruza o Camboja, sobe o Vietnam e volta para a Tailândia pelo Laos, que eu já incluí no teu roteiro :)
      Vou querer um relato detalhado da tua viagem pelo leste europeu pra postar aqui no blog!! Que tal?

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  7. Nossa, falou tudo! Estou com meu marido e filho de 3 anos a quase 9 meses viajando pelo sudeste da ásia e sei como é difícil explicar para as pessoas que aqui não é um lugar perigoso e difícil, na verdade ás vezes é até chato, porque os lugares são muito turísticos e todos falam inglês rsrs!
    Em todo esse tempo, nunca tivemos problemas com segurança, sempre ando com câmera na mão por ai sem nenhum problema.

    E é tão fácil encontrar o que precisamos por aqui, sempre tem um 7eleven ou mercadinho pra comprar coisas pra crianças!
    Gostei muito do blog de vocês, vou até mandar pra minha mão pra ela ver que tem outras pessoas "loucas" como nós rsrs!

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    1. Oi Amanda! Que inveja! 9 meses no sudeste asiático é tudo de bommmmmm...

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  8. Somos um casal do RJ e temos uma filha de 1 ano e 10 meses que já viajou para Campos do Jordão, Maceió, a maiorida das cidades daqui do estado e que voltou hoje de viagem por várias cidades da Bahia, acho que vou criar o blo Duda, a pequena viajante, hahaha!
    Adorei este post, estava um pouco familiarizado com esses países asiáticos, mas ainda não fazia ideia que eram tão desenvolvidos no assunto turismo. Certamente irei considerar para 2016 ou 17.
    Aproveitando o comentário, como o mais pesado é a passagem, quantos dias de viagem você acha interessante para aproveitar bem conhecendo mais de 1 país? Ou a ideia é gastar uma viagem para cada país?

    Beijão e parabéns pelo blog!!

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    1. Oi Fabio,
      Dá para passar 6 meses no sudeste asiático, tranquilamente. Para fazer valer a passagem, o ideal é ter no mínimo uns 20 dias de férias :)
      Obrigada pelo carinho!

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